CLÓVIS
Moura, talento multiforme, que o Piauí ofereceu ao Brasil, manda-me, de São
Paulo, a poesia abaixo transcrita. Homenagem à memória de Felipe dos Santos.
Dedica-a a Maria. Ei-la:
SIGNIFICADO DO SILÊNCIO
A noite tem um gôsto compacto.
As cobras escorrem em estrêlas
e
se espalham no vale da ira
Cabelos estrangulam pescoços
e os horóscopos se revoltam
contra o destino: e cospem.
Um raio transpassa o coração
do
pescador solitário que na ilha
olha
o umbigo e o peixe/alimento.
Sentenças
são escritas em azulejos
quebrados.
Há mascar de terra em bôcas solitárias partidas.
Contudo, ninguém falará aos corpos.
O
silêncio é alvenaria do futuro.
Podem
maltratar o corpo com vergastos,
a
bandeira será a mesma. O cuspo não atinge o rosto do herói. a ira constrói
estátuas no momento agudo, quando tôdas as túnicas são despidas
e
o homem fica virgem e incontaminado,
sômente
êle mesmo: puro ou podre.
Há quem deseje que o mar não se encapele
para a viagem à utopia. Outros
se
esquecem da estrutura das feras.
Alguns,
por isto mesmo fracassam e quebram o silêncio das palavras
e
das algemas.
Que dizer quando isto
é forma de ser, de proceder, de existir?
Preferimos
os peixes a êsses homens.
Entre
o silêncio e o som covarde
somos
os primeiros que estão com o primeiro.
Os
relógios marcam horas
compassados
pelo gotejar do sangue.
Mesmo
assim a palavra menor deve ser poupada
aos
ouvidos do algoz.
A pedra
deve
ser exemplo. Na hora da dor
mastigue
formiga e vento,
vidro
moído e sabre
e salive ódio.
Cuspa na crista dos valetes
que
apodrecem e fazem apodrecer.
Cuspa
ódio para que não haja
a
hora do apaziguamento
que
será cruz/sepultura
do
quase herói.
In:
TITO FILHO, A. Caderno de anotações. Jornal
do Piauí, Teresina, p. 5, 14 dez. 1971.
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