Quer ler este post em PDF?

segunda-feira, 28 de março de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (21)

A CONCEPÇÃO - De Olímpio de Sousa Andrade: "É o comentário ao trecho de 'Os Sertões' que nos retém ainda agora. Não negamos prováveis leituras de Alencar por parte de Euclides da Cunha, parecendo mesmo que êle teria puxado de 'O Sertanejo' para o círculo de seus heróis aquêle 'centauro' mais de uma vez pôsto em cena no romance, em cujas páginas bem que poderia também ter colhido ou reforçado certas informações, como a da mata virgem no sertão do Ceará do século XVIII, a das históricas e ricas vivendas, de landlords sertanejos, e até mesmo - quem sabe? - a sugestão para o próximo paralelo, sugestão do contraste que está gritando nos títulos dos dois livros de Alencar, O SERTANEJO, O GAÚCHO" ("História e Interpretações de Os Sertões" - 1963 - página 220).

AS NOTAS

1) Visitei a área industrial do Parque Piauí, programa que nasceu do esfôrço e da inteligência de Osvaldo Soares do Nascimento.

2) Do mestre ilustrado Antônio José Pacífico Marques: "Seu talento a serviço da Secretaria de Educação atesta clarividencia do gôverno e vislumbra magnificas perspectivas ensino nosso Estado".

3) De Frederico Brandt, ativo e educado gerente de "A Pernambucana": "Congratulações feliz escolha governador Clímaco seu nome ilustre Secretário Educação almejando profícua administração".

4) Do velho amigo e mestre Manuel Madeira: "Congratulo-me vossa investidura cargo Secretário Educação".

5) Dos bondosos amigos Tomás Areia Leão e família e Mariazinha Areia Leão: "Cumprimentos grande amigo".

6) Da dedicada professôra Antônio Lobão: "Corpos docente e discente Grupo Miguel Rosa congratulam-se vossa investidura cargo Secretário Educação".

7) Dos piauienses ilustres Petrarca Sá e Walmor Carvalho: "Enviamos prezado amigo abraços congratulações e votos êxito sua gestão frente Secretaria Educação e Cultura".

8) Da competente secretária do anexo Arlindo Nogueira, professôra maria Camélia Moura Fé: "Como admiradora de V. Exa. venho trazer-lhe os melhores votos de auspiciosa administração. Peço a Deus pela sua saúde, pelo seu bom trabalho, pois o Piauí precisa de V. Exa. Êste é o meu mais ardente desejo".

9) Da bondosa comadre Madalena Monteiro: "Congratulações pela sua nomeação para Secretário de Educação".

10) Do mestre Turene Ribeiro: "A sua nomeação não é só um ato de justiça do governador Clímaco de Almeida, que coloca como se diz vulgarmente o homem certo no lugar certo, porém representa uma homenagem do nosso Joqueira à cultura piauiense, de que você é sem dúvida o expoente máximo. Receba do seu humilde confrade as mais efusivas felicitações, que se dirigem mais à nossa mocidade estudiosa, que tem a felicidade de ter como guia na pasta da Educação um professor, jornalista e intelectual da sua estatura moral, cívica e intelectual".


A. Tito Filho, 12/06/1970, Jornal do Piauí 

sexta-feira, 25 de março de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (20)

NATAL – Gregório de Moraes, piauiense no Rio, sempre invulgar, está mandando aos amigos esta mensagem natalina:

"Quando eu encontro
por êstes corredores do pensamento
os gritos de minha meninice,
através das céculas da alma:
chamando os colegas
gritando os colegas
cainda na água
do parnaíba,
pulando estas cêrcas de buriti
de um bucolismo subdesenvolvido
que fere as entranhas
e gera saudades

Quando tudo isto
de apanhar mangas
e cajus
e sentar no tamborete
de madeira
inclinado contra a parede,
surge assim
de mansinho
dentro de mim mesmo

Eu me alargo em dores
e morro de tristeza".

A. Tito Filho, 08/12/1970, Jornal do Piauí

quarta-feira, 16 de março de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (19)

DA CORRESPONDÊNCIA - "São Mamede, Paraíba, 22 de julho de 1970. Dr. Tito Filho. Prezado senhor. Anexo a esta, segue um recorte do 'Jornal do Brasil'. Se possível queira me esclarecer o que se segue. 1.º Sei de cor o nome da representação piauiense na Câmara Federal desde 1946, e não me consta o nome do ilustre Dr. Carvalho Neto como Deputado Federal pelo nosso Estado. Estarei certo ou errado? 2.º As eleições regionais no Piauí se realizaram nos anos de 1946, 1950, 1954, 1958, 1962 e 1966, portanto desconheço mandato legislativo no quadriênio 56/60. O engano é meu ou do jornal? Aguardo resposta da presente, se possível na coluna dos jornais em que V.S. escreve, remetendo-me um exemplar. Subscrevo-me atenciosamente, Enéas do Val Melo - um piauiense na Paraíba".

Resposta: Carvalho Neto, se a memória não me falha, foi suplente de deputado federal pelo Piauí. Depois se candidatou a deputado estadual pela Guanabara (eleito). As eleições regionais do Piauí foram realizadas em 1945 (senadores e deputados federais), 1947 (governador Rocha Furtado, deputados estaduais e dois senadores - Joaquim Pires e Lulu Ribeiro, pois havia falecido o senador Esmaragdo de Freitas); 1950 (governador Pedro Freitas, um senador (Areia Leão), deputados federais e deputados estaduais); 1954 (governador Gayoso e Almendra, deputados federais, deputados estaduais e dois senadores: Leônidas Melo e Matias Olímpio, êste último reeleito); 1958 (governador Chagas Rodrigues, deputados federais e estaduais e um senador: Joaquim Parente); 1962 (governador Petrônio Portela, deputados federais e estaduais e dois senadores: Sigefredo Pacheco e Cândido Ferraz); 1966 (governador Helvídio Nunes, deputados federais e estaduais, um senador: Petrônio Portela). As eleições municipais foram realizadas em 1948 e, depois, nos mesmos anos das regionais.

AS NOTAS:

1) Do Secretário Executivo do MOBRAL, com data de 12.8.1970, do Rio: "Tivemos oportunidade de constatar com muita satisfação, a atenção e apoio que V.S. dispensou ao nosso trabalho."

2) De José Joaquim Monte, de Fortaleza, carta de junho de 1970: "Não poderíamos deixar de reconhecer e agradecer a quantos nos ajudaram no II Encontro Científico dos Estudantes de Medicina. Em nome da classe universitária brasileira, no campo da medicina, a quem tenho a honra de representar no momento, venho cumprir esta missão simpática de reconhecimento pela ajuda prestada pelo nosso particular amigo Tito Filho, na certeza de que sempre estará à frente de empreendimentos desta natureza, ajudando, estimulando, realizando. Sinto-me envaidecido e recompensado. O dr. Delson Rocha foi brilhante. A delegação do Piauí deu também uma demonstração de organização e interêsse pelos assuntos científicos. Estou radiante com o meu Piauí".


A. Tito Filho, 04/09/1988, Jornal do Piauí

quarta-feira, 9 de março de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (18)

ENCONTRO - de José Joaquim Monte, um dos organizadores do II Encontro Cientifico de Estudantes de Medicina que se realizará em Fortaleza:

"Mestre e amigo,
TITO FILHO,
abraços cordiais,

Recebemos a sua carta e logo em seguida mais dois recortes de jornais com matéria sobre o II ECEM. Realmente como não poderia deixar de ser, estamos por demais agradecidos com a grande colaboração que nos vem dando, através de uma cobertura jornalística precisa, atual e oportuna sôbre as nossas atividades. E esta satisfação cresce mais ainda ao sabermos que para a existência da mesma, necessário se torna uma base de compreensão clara e segura dos nossos propósitos, como também a certeza da importância e do significado do II ECEM, para nós que habitamos o lado de cá do Brasil.

Entre outros favores, que sabemos realizados contentamente pelo nobre mestre gostaríamos de falar sôbre o PLANO NACIONAL DE CONFERÊNCIAS, uma realização que vemos somar ao ECEM, na tentativa de tornar mais fácil esta gigante tarefa de fazer ciência, de difundir ciência, de praticar ciência, na esperança de mais uma vez sermos atendido por seus serviços.

O nosso interêsse pelo PLANO NACIONAL DE CONFERÊNCIAS se baseia no fato do mesmo ter passado a englobar também ao Piauí. E como o nobre amigo sabe, em tudo que possa ajudar ao Piauí, ali eu estarei com a mesma firmeza de sempre, os mesmos ideais e os mesmos propósitos. Em cada Estado nacional, o Plano Nacional de Conferencias, sob o patrocínio do Laboratório Pfizer, vem realizando as mais diversas explanações sôbre temas de Medicina geral, efetuadas pelas maiores autoridades nacionais sobre tais assuntos, com um aproveitamento gigante e uma aceitação enorme tanto pelos Médicos como pelos estudantes de Medicina.
Logo estarei remetendo uma exposição de motivos sôbre o mesmo, para que melhor seja compreendido.

Na certeza de que sempre a ciência e as iniciativas concretas encontrarão apoio no
nobre mestre, subscreve-me". 

X   X   X

CUMPRIMENTOS - Da generosidade de Jeremias Abreu Pereira da Silva: "De Brasília. Receba efusivos cumprimentos e minhas alegrias escolha talentoso conterrâneo e amigo compor secretariado governo João Clímaco Almeida. Abraços".


 
A. Tito Filho, 03/06/1970, Jornal do Piauí

terça-feira, 1 de março de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (17)

CENSURA - De São Paulo, com data de 10-5-70, Clóvis Moura, o notável escritor nascido no Piauí, escreve-me assim:

Meu caro A. Tito Filho,

Um abraço.

Carta sua é sempre motivo de alegria, daí está lhe respondendo a que me chegou ontem datada 30/4. Você voltou a abordar o problema de censura prévia que está em discussão no Congresso. Inicialmente, como não poderia deixar de ser, você se coloca contra. Acha, porém, que deverá existir punições para os falsos que fazem comércio com o sexo. E dá como exemplo, para ilustrar o que diz, Henry Miller. Acha você que ele devia policiar mais a linguagem, ou colocar o palavrão na bôca da personagem, o que não acontece. Quando Miller assim procede deixa de reproduzir os episódios artisticamente. Ora, o que acontece, para mim, é que nisto exatamente reside a estrutura unitária da obra de Miller. A sua mensagem é desagregacionista e em função dela coloca a sua arte, não apenas através da escolha de uma temática de fundo sexual mas usando a própria estrutura lingüística para transmitir ao leitor o que deseja. Podemos discordar inteiramente da mensagem de Miller, e eu particularmente discordo. O que não se pode negar é que há uma função naquelas palavras consideradas palavrões que atingem o leitor exatamente naquilo que o autor deseja: o seu embasamento moral, a sua ética convencional. Por tudo isso é que acho que um escritor como Henry Miller não pode ser julgado apenas pelas palavras que usa, mas principalmente, pelo que existe além das palavras, ou seja, a sua cosmovisão, o mundo ideologico que êle procura impor aos seus leitores. A agressividade de Miller no que diz respeito à linguagem usada faz parte, portanto, de uma estrutura artística que êle montou para transmitir o seu desagragacionismo desesperado, procurando equiparar todos os valores convencionais, todas as normas de conduta e ação a um nível de coisa em dissolução. Vou citar um trecho para ver se me explico melhor. Diz êle em "Trópico de Câncer": "Há cem anos ou mais o mundo, nosso mundo, vem morrendo. E nem um só homem, nestes ultimos cem anos, foi tão louco que colocasse uma bomba no ôlho do cu da criação e o detonasse. O mundo está apodrecendo, morrendo aos poucos. Mas precisa do coup de grâce, precisa ser reduzido a pedacinhos por uma explosão".

Repare você a intencionalidade do palavrão para despertar o leitor e o sacudir para a sua mensagem catastrófica e pessimista. Funciona como uma colherada de alcatrão que o artista derrama na boca do leitor contra a sua vontade. Por isto mesmo, dentro da estrutura da obra de Miller, ele tem uma função. Se Miller policiasse a sua linguagem estaria negando que acredita naquilo que êle prega: o fim de todos os valores. Sua obra, por isto mesmo, apesar de toda a critica que desperta, ficará como documento de uma época de desespêro, quando os homens vivem sob a neurose de uma guerra nuclear, documento que demonstrará, quando outro fôr o quadro das relações humanas, como a arte é um reflexo da realidade social, refletindo tôdas as suas nuances: a negra e a branca.
Quando Dante colocou palavrões no 1º Canto da "Divina Comédia" o fêz exatamente para que o Inferno vivesse a sua realidade... infernal.

Sômente quando o artista nada tem a dizer, é vazio, é que apela para a pornografia (palavra aliás muito relativa e que pode ter significado muito elástico), ou seja, quando a sua intenção é apenas despertar no leitor a sensação de sexo, sem mais coisa para dizer. Aliás, você deve ter reparado que as descrições de sexo mais desbragadas em Miller não despertam no leitor sensualismo ou possibilita excitação. Pelo contrário. O leitor fica nauseado, porque Miller é, de fato, um dos grandes escritores cuja mensagem é a náusea universal.

Mas o perigo da coisa mão está aí, porque então ela ficaria restrita ao âmbito intelectual e entre nós tudo se resolve. O perigo está no direcionamento da censura. Não creio que haja perigo de dissolução da familia causada por livros, mesmo aquêles considerados pornográficos, isto porque num país de analfabetos como infelizmente ainda é o nosso, pouco ou quase nada se lê. E os leitores são sempre maiores de idade e de famílias relativamente abastadas. Daí não acreditar na falsa moral do sr. Plínio Salgado ao dar o seu parecer sôbre o assunto e pedir a censura prévia para os suplementos literários, como se lá estivesse o câncer da depravação dos costumes instalado. Você não acha? O conceito de arte depravada foi, aliás, muito usado por Hitler e suscitou a prisão, a morte e o desterro de centenas de escritores, pintores e escultores da Alemanha. Aqui a coisa está neste pé: serão os escritores responsáveis pela onda de dissolução que atinge, a olhos vistos, no mundo inteiro, uma juventude desesperada, sem horizonte, cuja perspectiva mais otimista é a guerra no Vietname e a mais pessimista o fim da civilização por uma guerra nuclear? Ou pelo contrário, não serão os falsos Catões, que não abrem o leque da esperança para esta juventude os responsáveis mais diretos e acham cômodo jogar nas costas dos escritores a responsabilidade por uma situação que nós não podemos controlar? É muito fácil apreender livros. Com isto salvaremos tudo, solucionaremos as causas profundas da prostituição, tão combatida mas tão aproveitada pelos falsos moralistas? Acho que não. Prefiro, como escritor, travar a luta com os falsos escritores, no plano intelectual. Não aceito, no entanto, que alguém que não tem as minimas condições de sensibilidade e de cultura diga o que é bom e o que é ruim. Prefiro correr o risco, com muito trabalho, aliás. Nós escritores é que temos o direito e o dever de, na luta pelo desenvolvimento da nossa cultura, dizer o que é bom e o que é mau. Temos critérios de valores objetivos para julgar as obras de arte. Não precisamos de tutores políticos, de políticos que não solucionam sequer os problemas... políticos...

Se todos os problemas que a sociedade atual enfrenta (inclusive a brasileira) fôssem solucionados através da apreensão de livros a coisa seria muito simples. Mas eu não acredito em soluções simplistas. Logo depois de 1937 foram queimados em auto de fé centenas de livros considerados pornográficos. E, por coincidência (?) o sr. Plínio Salgado, então às voltas com o Integralismo, foi quem liderou a queima. E sabe, meu caro, quais livros foram considerados pornográficos? Os de Gilberto Freire, as obras de Antropologia de Artur Ramos, os romances de Raquel de Queirós, Érico Veríssimo, Jorge Amado, José Lins do Rêgo, José Américo, Armando Fontes, e muitos outros. Todos foram queimados em nome dos bons costumes. Se êsses livros são considerados as expressões mais importantes da geração de 30, não o são pela vontade dos censores.

Orgulho-me da minha condição de escritor. Orgulho-me mais ainda da função de escritor. E é por isto que sou contra qualquer tipo de censura. Uso como norma aquelas palavras de Péricles no seu "Discurso aos Atenienses": "Lembrai-vos sempre de que não existe felicidade sem liberdade, e de que o fundamento da liberdade é a coragem".

Bem, o desabafo saiu de um jato só. Aqui se despede por hoje o seu amigo de sempre.


A. Tito Filho, 13/06/1970, Jornal do Piauí