Quer ler este post em PDF?

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (16)

A "Antologia de Sonetos Piauienses", que Félix Aires organizou com talento para homenagear esta terra, abriga o sonêto "Árvore Velha", concebido pela inteligência de Raimundo da Costa Ribeiro:

Árvore velha, esqueleto apenas,
Chocalhando ao vento
Fantasma dos passarinhos... Árvore velha, sêca,
miserável, moribunda, resquicício de vida.

Quem diria que nesta manhã
me surpreendesses,
verde, coberta de fôlhas,
e tôda enfeitada de flôres amarelas?

Árvore renovada,
amiga dos passarinhos,
filha dos caprichos da natureza,

te acabrunha, murchas,
floresce de nôvo, e eu envelheço,
sucumbo, e não floresço mais!...


A. Tito Filho, 24/09/1970, Jornal do Piauí

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (15)

CARTA - Do escritor J. Miguel de Matos recebo a seguinte, com data de 30-5-70:

"Na iminência de sua posse na Secretaria de Educação e Cultura do Piauí, para onde vai por convocação sábia e oportuna do Governador João Clímaco D'Almeida. Devo trazer-lhe, como escritor modesto, algumas palavras que poderão ressoar, pela lógica com que estão dosadas, muito profundamente dentro de seu espírito.

Em Fortaleza, Capital do vizinho Estado do Ceará, quando ali estive para os passos iniciais da publicação de Pisando os Meus Caminhos, concedi entrevista ao jornal Unitário, tendo insistido, no decorrer dela, que a secretaria de Educação e Cultura do Piauí funcionava, apenas, de uma banda: Educação, por ter à sua frente um homem que possuia, apenas, a formação de Educador.

Agora, com a sua presença naquela Secretaria, o problema cultural de nossa terra, com o leme nas mãos do timoneiro certo, poderá receber nôvo e poderoso alento, valendo lembrar que sua nomeação para aquela Pasta, encontrando 'de súbito, o diamante do seu talento a cravação que Deus lhe destinara', tem muita similitude com a transformação de Paul Sousay, mestre da critica francesa contemporânea, de comentarista político a censor de literatura. Paul Souday encontrou sua verdadeira vocação pela argúcia de Adrien Hébrard. E você, Mestre chega ao seu lugar certo, pela experiência de João Clímaco D'Almeida.

O escritor piauiense - e isto não é novidade para você que é um pesquisador arguto e incansável da vida cultural do Piauí - permanece marginalizado, e, quando publica um livro, depois de vencer muitas dificuldades de afastar muitas pedras e de carpir muita desgraça moral, tem de fazer como o vendedor de banana: sair pelas ruas da cidade oferecendo, com uma espada de gêlo confiada na alma, sua mercadoria pouco aceitável, porque produzida numa região onde se valorize mais a barriga do que a cabeça. O governo do Estado ainda não deu ao escritor piauiense, não sei se por razões mesológicas, a atenção que está a merecer, deixando de ser visto, como aconteceu até agora, como mero vendedor de livro.

Ao fazer esta carta, caro Mestre, ocorre-me que já levei ao seu conhecimento - na personalidade do combativo jornalista de ontem - a deplorável posição do escritor piauiense, que só faz literatura por duas fortes razões: vocação e amor a terra natal.

O problema cultural do Piauí continua, a meu ver, na estaca-zero.

E a sua presença na Secretaria de Educação e Cultura do Estado, por um tempo mínimo, não vai ser motivo de solução para tão grave problema da vida piauiense.

Mas tenho certeza, mesmo que esta carta não lhe chegasse às mãos zelosas, que algo será feito por ele e por aquele que é seu oficiante.

De mim, Mestre, já habituado com as urzes dos meus caminhos, nenhuma intenção de ser aquinhado, pois me preocupo mais com os colegas dêste oficio, que ainda não pode ser exercido no Piauí.

O oficio de facetar, com o burel do sentimento as arestas do espirito.

De fora, metido na noite do meu insulamento e da minha solidão, me sinto muito feliz com o brilho distante das estrêlas.

As pedras, Mestre, não doem para quem caminha apenas sobre pedras".


A. Tito Filho, 10/06/1970, Jornal do Piauí

domingo, 13 de fevereiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (14)

Clóvis Moura - De São Paulo, o talento do conterrâneo Clóvis Moura manda-me esta admirável concepção poética:

A CORRIDA VIDA/MORTE

Cavalos brancos galopam
levando o teu corpo leve:
são fantasmas espantados
numa planície de neve.
Cavalos brancos desfazem
a gaze dos teus cabelos
no vento que açoita a Lua
e desmancha os arvoredos.
Cavalos brancos galopam:
navegam brancos de mêdo
e a corrente do passado
segue montada nas ancas
dos cavalos em atropêlo.

O teu corpo vira nuvem,
vira semente de gêlo
e os cavalos que cavalgam
para o monte do sêgredo
resfolegam ar de espanto
e labaredas desfeitas.
Voa o teu corpo levado
por cavalos que galopam
para o monte do segrêdo:
a tua espádua é uma Lua
que está procurando órnita
e gira fora do mêdo.

Nos sete cavalos negros
carregam o teu ataúde
e na noite o cardo verde
     fura os teus olhos na treva,
Quis segurá-los, não pude,
e êles carregam na noite
teu ataúde de virgem
deitada em cavalos brancos
que têm as crinas de tule.
Não sei se os cavalos brancos
irão teu corpo entregar
aos sete cavalos negros
que levam o teu ataúde
onde te querem guardar.

Mas, o meu grito na noite
irá por certo espantá-los
e talvez deixem o ataúde
no arquipélago louco
onde não mora o luar.
Os sete cavalos negros
correm com o teu ataúde,
vão à procura dos lôbos
e eu quis detê-los: não pude.
Os cavalos brancos levam
teu corpo desfeito em nuvem
e eu na noite, insone e rouco,
quero deter os cavalos
que levam o teu ataúde.

Os cavalos brancos cavam
espaços para reter-te
e os sete cavalos negros
que levam o teu ataúde
correm atrás para alcançá-los.
Na noite eu grito infinitos
para detê-los: não posso!
Será que a Morte deseja
deter teu perfil sagrado?
Será que os cavalos negros
são seus mandados vassalos?

Mas, o teu corpo na nuvem
corre sôbre outros cavalos:
cavalos brancos que levam
teu corpo para o arquipélago
onde eu posso resguardá-lo.
Grito infinitos na noite
para que cheguem os cavalos
que trazem o teu corpo branco:
não quero os cavalos negros
que trazem o teu ataúde
para na Morte guardá-lo.


A. Tito Filho, 15/09/1970, Jornal do Piauí

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (13)

ALVINA - Jornais, rádios, televisões de Fortaleza registraram, com muita justiça, o lançamento, na capital cearense, do livro "Quinze Contos que o Destino escreveu", da piauiense Alvina Gameiro, celebrada poetisa e ficcionista. Presenças ilustres na solenidade. De "Unitário" copio: "Alvina Gameiro, a conhecida escritora de muitos sucessos literários, autora de programas para TV, romances, poesias e contos, entra hoje para lista dos contistas nordestinos com um livro de acentuado sabor clássico, pois ela sempre procura usar, em suas produções, o melhor, em matéria de linguagem. Alvina não escreve descuidosa nem descuidadamente. Ela trabalha os seus livros pacientemente, calmamente, sem pressa, sem pensar no tempo que poderá gastar, sem fazer concessões a qualquer impureza lingüística".

AS NOTAS

1) Em Teresina, próximo dia 19, nomes representativos da Campanha Nacional das Escolas da Comunidade: Almirante Benjamim Sodré, Professor Felipe Tiago Gomes, Professor Wilson Cardoso e Professor Antônio Joaquim Coelho da Cunha.

2) Do dedicado Delegado de Estatística no Piauí, Orlando Queiroz: "Expresso a V. Exa. sinceros agradecimentos pela organização e realização do Concurso de Frases sobre o Recenseamento, levado a efeito por essa Secretaria de Estado, através do Departamento de Ensino Primário, com especial destaque à Professora Maria Cecília da Costa Araújo Mendes, que no decorrer e conclusão do referido concurso demonstrou todo o seu especial carinho, de modo particular quando da entrega dos prêmios aos alunos cujas frases da entrega dos prêmios aos alunos cujas frases foram selecionados".

3) Por emissário especial, encaminhamos ao Ministério da Educação as prestações de contas da Secretaria de Educação até o ano de 1968. Trabalho sério de uma equipe de altos funcionários.

4) Tomei posse como membro do Conselho Diretor da Fundação do Ensino Superior do Piauí.
5) Reunião do magistério de Educação Física (Ensino Médio). Convite do Prof. João Antônio Leitão. Presença do Secretário de Educação e da Diretoria do Departamento de Educação Média. Diálogo de duas horas. Exame dos problemas que afligem os educandários de Teresina.

6) Não está funcionando o Curso de Maduzera em Floriano. Motivo: nenhuma das emissoras de Teresina alcança aquela cidade.

A. Tito Filho, 17/09/1970, Jornal do Piauí