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sexta-feira, 9 de outubro de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (201)

O PROFESSOR Lima Cordão realizou viagem de visita a algumas Associações de Pais e Amigos de Excepcionais. Entusiasmou-se com a de Recife: "Uma equipe de educadoras à altura da moderna pedagogia aplicada ao excepcional; instalações maravilhosas; oficina pedagógica bem montada; assistência médica e odontológica completa". Da APAE de Maceió disse Cordão: "Entidade atuante. Em Maceió, o movimento de amparo ao excepcional é assunto que conta com a participação do povo e das autoridades, graças à extraordinária capacidade de trabalho do seu líder Robert Rubens Paranhos Jambo". De Garanhuns, Cordão trouxe essas impressões: "Uma senhora, muito jovem, mãe de quatro filhos normais, dedica-se de corpo e alma a causa do excepcional. Trata-se da dinâmica professora Ana Maria Lima Veloso, esposa do dr. Paulo Gervásio. Esta senhora constitui uma atuante APAE". Em Natal, o visitante viu "um trabalho dignificante". A respeito de Fortaleza escreveu Cordão: "Escola de ambiente dos mais salutares. Salas amplas e confortáveis. Prédio moderno. Ótimas instalações". Cordão pretende visitar a APAE de Parnaíba, confiada a Monsenhor Antônio Sampaio.

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DA CORRESPONDÊNCIA. "Teresina, 24-2-72. Prof. Tito Filho, venho agradecer-lhe a oferta do maravilhoso e belíssimo livro da saudosa professora Cristina Leite, CANÇÕES DE HOJE - CANÇÕES DE OUTRORA. O livro é valioso e não deve ser faltar nas boas bibliotecas. É uma obra que prova que em nosso Estado existem pessoas de talento. Ouvinte constante do seu programa. a) Liduína Maria de Sousa Melo".

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JOVENS que visitaram Teresina, com o objetivo de realizar filme no cenário de Sete Cidades, manifestaram o desejo de filmar "Sinhazinha de Carnaque", festejado romance de Lilizinha Castelo Branco de Carvalho. Idéia excelente. Trata-se de um livro de costumes piauienses, no ambiente rural do Piauí. História encantadora. Os rapazes fizeram entre nós "GURU DAS SETE CIDADES", com enredo pisado e repisado, de muito mau gosto. Teresina invadida por HIPPIES. Sete cidades habitada por gurus. Hippies nas Sete Cidades, onde se encontra um casal de turistas, marido e mulher. Luta entre hippies e gurus. O filme tem cenas finais em Luís Correia, na praia. Um tarado assalta a mulher turista, arranca-lhe a roupa, inclusive a calcinha interna. Mulher nua correndo pela praia, tarado atrás, calcinha espetada no dedo indicador. Erotismo. Pena é que o governo do Estado esteja solidário com tal exemplo de mau cinema.

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CARTA RECEBIDA: "Teresina, 24-2-72. Estimado professor Tito Filho. Prezado mestre. Já me habituei a ouvir o seu programa noturno na Rádio Difusora, às 22 horas, diariamente, e a prova é que várias vezes lhe tenho escrito, consultando-o ou lhe pedindo informações e cujas respostas sempre me foram plenamente satisfatórias. Hoje novamente volto a lhe fazer perguntas, esperando ser mais uma vez atendido na medida do possível: 1) Essa nova reforma ortográfica, a que muitos jornais e revistas já estão obedecendo, está oficializada? O trema foi suprimido por completo? 2) Se o acento diferencial foi suprimido, também o foram os homonimos homográficos? 3) Qual a origem e o significado das palavras GUANABARA e CARIOCA? 4) O gaulês é o idioma dos antigos gauleses. Eu lhe pergunto: o gaulês é língua morta? Era também língua falada na França? Certo do atendimento. a) Luís Pereira da Silva". RESPOSTAS: 1) A reforma é oficial. Lei do Congresso Nacional, sancionada pelo Presidente da República. O trema não foi totalmente abolido. Permanece no U, quando esta vogal se pronunciar, caso esteja seguida de E ou I e antecedida de G ou Q. É o caso, por exemplo, de CINQÜENTA, de AGUËNTAR. Devo esclarecer que o autor destas linhas não emprega o trema em circunstância alguma. 2) Não foram suprimidos os homônimos nem o homográficos, pois não se podem suprimir FATOS da língua. Os estudiosos balizam como HOMÔNIMA as palavras que se pronunciam do mesmo modo e são diferentes na escrita (cinto e sinto), ou que têm escrita idêntica e significam cousas diferentes, como LIVRO (substantivo) e LIVRO (do verbo LIVRAR). Como se vê, a lei não poderia extinguir os HOMÔNIMOS, pois estes existem, encontram-se na VIDA da linguagem. HOMOGRÁFICAS são as palavras que se escrevem do mesmo jeito, como COROA (substantivo) e COROA do verbo COROAR, ambas de pronúncia fechada, tanto o substantivo quanto o verbo. A última reforma não poderia VARRER tais palavras da língua usual. A regra antiga dizia: quando houver palavras homógrafas, se uma delas tiver SOM ABERTO e a outra tiver SOM FECHADO (heterofônicas), põe-se o acento circunflexo na que tiver som fechado. Era o célebre ACENTO DIFERENCIAL, que aparecia em, por exemplo, ALMOÇO (substantivo, som fechado) para distinguir de ALMOÇO (verbo, som aberto). Desapareceu o acento diferencial com a última reforma, - e esta manda aplicá-lo no pretérito perfeito de PODER, terceira pessoa do singular, PÔDE para evitar dúvida relativamente à terceira pessoa do singular do presente do indicativo: PODE. 3) Os estudiosos assentam que GUANABARA é forma corrompida de GUA (seio), NÃ (semelhante, parecido) BARÁ ou PARÁ (mar). Significa SEIO SEMELHANTE AO MAR. Elementos tupis. A respeito de CARIOCA explica Romão da Silva que se trata e alteração de ACARY-OCA - casa ou viveiro de ACARIS. Acrescenta que ACARI é nome de peixe de água doce, peixe cascudo, e com esses peixes os tamoios comparavam os guerreiros encaroçados das guarnições portuguesas aquarteladas na primeira casa de pedra da cidade do Rio e que passou a ser chamada pelos índios A CASA DOS ACARIS (OCA em tupi vale CASA). Romão registra também CARAY-OCA ou CARAYB-OCA como residência ou casa do branco, do senhor, dos mandões. Batista Caetano, no "Vocabulário", escreve que CARAY é nome muito espalhado nas Américas. No Paraguai quer dizer SENHOR. Para ele CARIOCA significa A CASA DO BRANCO. Para o notável Teodoro Sampaio - O TUPI NA GEOGRAFIA NACIONAL - CARIOCA é o mesmo que CARIÓ, corrompido em CARIOCA, a casa do branco, a residência do europeu. 4) Gaulês é o nome dado ao velho céltico continental falado na Gália antes da conquista romana. a Gália compreendia a área entre o Rio Reno e os Pirineus. Conquistada por César, foi durante cinco séculos província de Roma. O latim tornou-se a língua das pessoas educadas. Foi a Gália, no terceiro século da nossa era, conquistada por povos germânicos - no caso um desses povos - os francos que estabeleceram o primeiro grande reino no que iria ser a França. A língua dos gauleses foi suplantada pela língua dos dominadores, em choque também com a língua dos dominadores. A ação substratistica e a ação superstratistica fizeram o idioma francês.       



TITO FILHO, A. Caderno de Anotações. Jornal do Piauí, Teresina, 02 mar. 1972, p. 3/6.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (200)

Com o título UM LIVRO DE MÉRITO LITERÁRIO, mestre Cunha e Silva, com superior talento crítico, escreveu o seguinte:

"Durante alguns anos, no Colégio Estadual Zacarias de Góis, fui colega de magistério da saudosa Professora Cristina Leite - mulher das mais inteligentes que conheci. Nos intervalos de aula, inúmeras vezes, entretive com ela conversas instrutivas, pelas quais verifiquei que ela era possuidora de inteligência arguta e penetrante, exornada de vários conhecimentos humanísticos. Os assuntos preferenciais das suas palestras comigo eram questões linguísticas e de literatura, quando não versávamos sobre temas filosóficos e sociológicos. Cristina Leite possuía mentalidade arejada, imunizada de preconceitos e superstições, e não se detinha na prosa corriqueira, não comentava trivialidades e futriquices da vida social e profissional. Tinha sempre aprumo na conversação sadia e séria que tanto me deleitava o espírito. Não estranhei, por conseguinte, quando A. Tito Filho, com a penetração crítica da sua inteligência privilegiada, me falou, dias atrás, do livro de Cristina Leite agora dado à publicidade, exaltando-lhe o mérito incontestável de ser o primeiro escritor em nosso país a fazer o estudo comparativo entre a poesia popular do século XII, oriunda da poesia provençal, e a poesia popular da época contemporânea, como é espelho a do Brasil. A autora de CANÇÕES DE HOJE - CANÇÕES DE OUTRORA soube tão bem apreciar a evolução da poesia popular e mostrar a similitude sentimental e emotiva que existe entre o lirismo medieval e o lirismo de nossos dias, como disse A. Tito Filho no prefácio do livro, demonstrando, mais uma vez, que é autoridade nos estudos do nosso Vernáculo e da nossa Literatura, pelo que o reputo maior crítico literário de nossa terra, mas crítico sem os azedumes de certos críticos literários que só descobrem falhas nas obras literárias que lhes levam para apreciação e nunca têm palavras de estímulo aos autores principiantes, quer de livros em prosa, quer de livros em verso. Pela análise e confronto que Cristina Leite fez da canção popular medieval, em épocas e países diferentes, com a dos nossos dias, aliás, com a originalidade que eleva, sobremodo, o valor literário do seu livro ora em circulação em nosso meio é que se deduz que a alma do povo é a mesma em todos os tempos. As canções e cantorias de ontem e as canções de hoje, com as diferenciações de linguagem e apresentação vocabular, traduzem os sentimentos e aspirações do povo com as expansões peculiares a cada época. Não há progresso científico ou técnico que consiga matar na alma do povo o amor à literatura, o amor às musas, à prosa, às artes e à oratória, à poesia que se manifesta sob múltiplas formas e estilos. Os trovadores, os seresteiros, os bardos e vates de todas as escolas literárias nunca deixarão de existir. Pelo talento e originalidade com que a escritora Cristina Leite se expressou em seu livro magnifico, a leitura dele aumentou em mim a convicção de que a poesia popular, como fonte de inspiração da sabedoria do povo, independe de graus de cultura e de civilização, ela surge, viva e exuberante, tanto entre os povos mais atrasados, como entre os povos mais cultos e adiantados. Os povos, em todas as idades históricas, têm as suas angústias, as suas alegrias, as suas dores, os seus sofrimentos, os seus amores e paixões, os seus sonhos e quimeras, enfim, os seus problemas políticos e sociais e as suas competições econômicas e reivindicações territoriais, e tudo isso vem servindo de inspiração aos poetas, trovadores, músicos cantores. Vejam a ILÍADA e a ODISSEIA, de Homero, os LUSÍADAS, de Camões, e os versos de fundo social do nosso sublime Castro Alves. Vejam as produções do nosso folclore e o de outros países; as canções e cantos dos nossos poetas antigos e contemporâneos; as improvisações poéticas dos repentistas e violeiros dos nossos sertões. Constituiu, pois, para mim, grande prazer intelectual a leitura do interessante livro de Cristina Leite, em vida consagrada como professora competente e amada pelos alunos, depois de morta receberá, agora, com toda a certeza, a consagração popular como escritora talentosa e brilhante. Agradeço ao douto confrade A. Tito Filho a oferta que me fez dum exemplar do valioso livro da inolvidável Professora Cristina Leite - Mestra que tanto honrou o magistério piauiense com os fulgores de sua cultura e com os exemplos edificantes do seu coração bondoso, sensível por demais às misérias do próximo e revoltada contra as injustiças sociais".



TITO FILHO, A. Caderno de Anotações. Jornal do Piauí, Teresina, 02 fev. 1972, p. 3.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (199)

DE MOGI DAS CRUZES. Inocêncio Candelária escreve a Oliveira Neto: "Já li o seu novo livro e abraço-o com a minha admiração, o meu respeito, a minha estima pela sua nova e bonita contribuição à nossa poesia, ao valor que novamente o amigo dá ao verso brasileiro através do facho de sua brilhante inspiração".

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OLÍMPIO Pereira Neto ofereceu ao público obra de definição do papel que deve desempenhar o professor na sociedade do nosso tempo. A TERCEIRA PESSOA DEPOIS DENIGUÉM é livro de orientação, de estímulo, em que se revela a personalidade do mestre, como líder da educação dos jovens. Linguagem apurada. Raro domínio da síntese. Em cada período curto - uma lição, uma análise da notável expressão do professor dentro da escola e fora dela. Abraço efusivamente o jovem líder do magistério de Goiânia, idealista e conhecedor da tarefa educacional que cabe ao magistério.

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EM "Os Grandes Julgamentos do Supremo", de Edgard Costa leio o rumoroso caso do atentado contra a vida do presidente Prudente de Morais, o primeiro civil que ocupou a primeira magistratura da nação, logo depois de Floriano Peixoto. Do episódio saiu ferido e morreu o ministro da Guerra, marechal Bitencourt, que se sacrificou em defesa de Prudente. Autor do atentado: Marcelino Bispo. Conhecidos políticos foram presos, sob acusação de mandantes do crime: João Cordeiro, Francisco Glicério, Barbosa Lima, Alcindo Guanabara, Irineu Machado. Recolhidos à ilha-presídio de Fernando de Noronha. Dois julgamentos de pedidos de habeas-corpus em favor dos presos: o Supremo negou o primeiro pedido. Concedeu a ordem, em nova impetração.

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INDAGAÇÃO de Antônio José Silva, estudante do Colégio São Francisco de Assis: "Que quer dizer Árcade? E Arcádia? RESPOSTA. Árcade era chamado o membro da Arcádia, instituição intelectual criada no século XVII, por Cristina, ex-rainha da Suécia, residente em Roma. Observe-se que os amigos da ex-soberana é que transformaram em Arcádia, o cenáculo literário por ela instituído. Compunha-se a Arcádia de dezesseis membros. Explicação do nome: Arcádia foi região da Grécia Antiga, habitada por pastores, "que se divertiam com canções de amor e  pugnas poéticas, caracterizadas pela simplicidade e espontaneidade". Patrono da Arcádia, Menino Jesus (simplicidade). Foi movimento literário, que se propagaria por toda parte, como reação contra o chamado Barroquismo, de muito mau gosto. Os árcades queriam clareza. Ao Barroco os árcades contrapuseram "a razão, a simplicidade, a naturalidade expressional, como caminho para a boa realização poética". Pretendiam os árcades o Classicismo puro e genuíno.

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A MENINA chegou ao Colégio com atraso de alguns minutos, mas conseguiu permissão do professor para ingresso na sala de aula. Tanto bastou, um gesto abusivo, a direção do educandário, avisada do fato, determinou que a estudante se retirasse da aula. Ninguém educa com arbitrariedade, com violência contra a personalidade de seres em formação, excepcionalmente. Um diretor de estabelecimento de ensino será um bom conselheiro, um amigo, um orientador. Nunca um capitão-do-mato, daqueles da lei do pega-pra-capar.
      


TITO FILHO, A. Caderno de Anotações. Jornal do Piauí, Teresina, p. 4, 01/02 jun. 1972.

domingo, 8 de março de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (198)

DE JOÃO DE BARRO, com data de 20-2-72: "Professor Tito Filho. Uma vez que o prezado mestre, bondosamente, tem demonstrado, por mais de uma oportunidade, que tem gostado dos meus artigos, ofertados pelo seu humilde amigo e admirador, junto a esta vão mais dois. Quero que o prezado mestre tome conhecimento do seguinte: uma das páginas do meu livro de anotações, onde constam os nomes dos brilhantes jornalistas que, dada a grandeza de seus corações, têm acolhido, para satisfação minha, os artigos que tenho escrito em forma de humorismo, foi, hoje, brilhantemente ornamentada com o nome honrado, respeitado e acatado de um cidadão que se chama José de Arimathéa Tito Filho. Professor, jornalista e advogado, podemos afirmar que é, sem favor, a honra e glória do nosso tão querido Piauí e, por que não dizer, do Brasil. Tito Filho, que é mais conhecido nesta capital do que feijão em casa de pobre, em bora com toda a sua invejável cultura, inteligência privilegiada - herança do seu digno pai - ótimo professor, jornalista e brilhante advogado, homem que, pela capacidade d trabalho, zelo e honestidade, honrado os cargos que tem exercido, é sem dúvida, um cidadão pobre. Enquanto o professor Tito Filho, com todo o seu cabedal de sabedoria, contínua pobre, trabalhando dia e noite, distribuindo grande parte do seu saber com os nossos jovens, quantas nulidades existem aqui, como em outros Estados, sem que nada façam em benefício de ninguém, a não ser enriquecerem. Como? Não sabemos. Em se tratando de professor, eu perguntaria, sem nenhum vestígio de bajulação, onde estão os milhões de cruzeiros, os terrenos expostos à venda para a construção dos Albertões e outras grandes obras, as casas para serem alugadas ao Estado por bom dinheiro, as fazendas de gado pertencentes aos Tito Filho, aos Cunha e Silva, aos Martins Vieira, aos Odilon Nunes, aos Lisandro e Edgar Tito, aos Antilhon Soares, aos Francisco César e tantos outros? Esses brilhantes mestres, que vêm lecionando há mais de trinta anos, de colégio em colégio, na conquista do pão d cada dia, transmitindo o seu saber, com honestidade e devoção, aos nossos jovens, têm hoje, quando muito, talvez, uma casa para morar. Daí a razão por que poucas são as pessoas que se dedicam, hoje em dia, à nobre e honrosa missão de ensinar. Quantos a quantos ex-alunos desses mestres estão, hoje, gozando de ótima situação financeira e exercendo altos cargos aqui e em outros Estados, vendo, com tristeza, que os seus antigos mestres ainda continuam tão pobres, como sempre".

OBSERVAÇÃO. Gratíssimo ao generoso amigo. Para que os professores do Piauí tivessem um pouco de tranquilidade financeira bastaria que ganhassem o que o dr. Lourival Parente está ganhando na reforma do Hotel Piauí. Sabe-se que o contrato respectivo é leonino. E a gente saber que o governo conta com muitos engenheiros ilustres nos quadros do funcionalismo estadual.   


TITO FILHO, A. Caderno de anotações. Jornal do Piauí, Teresina, s/p mar. 1972.

sábado, 7 de março de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (197)

NO JANTAR modesto, simples, de confraternização espiritual dos membros da Academia Piauiense de Letras, pela passagem dos cinquentas e quatro anos de fundação do sodalício, pronunciei palavras de muita sinceridade. Lembrei o idealismo dos dez fundadores, dentre os quais vivos um só, Edison Cunha, crítico, orador, advogado de têmpera. Recordei a mocidade divina d Lucídio Freitas, os dias de entusiasmo e palpitação da Academia e os seus tempos de marasmo, de estagnação. Não me esqueci de Simplício Mendes, estuaste de entusiasmo, nos seus vários mandatos de presidência, e dos outros presidentes, como Clodoaldo, Higino Cunha, Martins Napoleão, Clidenor Santos, Álvaro Ferreira. Pratiquei justiça com Leônidas Melo, governador do Estado, que tanto a prestigiou, editorando obras dos acadêmicos, e com o ex-governador Helvído Nunes, solidário intransigente com as comemorações do cinquentenário. E expus o quadro de penúria em que vive, faz tempo, a Casa de Lucídio Freitas, sem um abrigo seu, vivendo em salas que as administrações lhe emprestam, ou reunindo-se nas residências particulares dos seus presidentes. Constrangedora a circunstância de a Academia possuir apenas patrimônio material de setecentos e oitenta cruzeiros. Ao menos podia pagar a edição da Revista Acadêmica. Depois destas expressões, houve o discurso do governador Alberto Silva, bem escrito tocado de humilde e rico de conceitos definidores das responsabilidades dos intelectuais. No final, a concessão de uma sede provisória à Academia Piauiense de Letras - sede que a Academia aguarda com ansiedade.

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GERARDO Almeida exerceu, com altivez, durante meses, o mandato de vereador de Teresina (ARENA). Deixou o legislativo municipal, porque o Superior Tribunal Eleitoral reconheceu que Osmar Mendes havia padecido injustiça. Na eleição foi mais votado do que Gerardo. E este, de vereador, desceu para a primeira suplência. Na Câmara, entretanto, Gerardo revelou-se cidadão de ideias, de pensamentos, com a capacidade e o direito de DIVERGIR. Tristes dos homens que não podem, por medo ou ignorância, utilizar-se dessa prerrogativa chamada DIVERGÊNCIA. Não são homens. São castrações de inteligência  de dignidade humana. Sub-homens. Verificaram-se recentemente eleições para composição dos diretórios udenistas. Gerardo foi arredado. PUNIRAM-NO. Aliás, puniram o sublime direito que os homens têm de PENSAR, de DIVERGIR. Mas essas PUNIÇÕES exaltam, nunca enfraquecem a personalidade dos punidos.

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DE RENATO Castelo Branco, escrevendo a respeito do Piauí e do piauiense, em obra publicada o ano passado:

- É neste labor prematuro, que lhe é imposto desde a mais tenra idade, não tem sequer a compensação de um regime alimentar recuperador. Ao contrário, agravam-se as perdas orgânicas de uma vida árdua, sob o esgotamento de um regime alimentar superdeficitário".

- "Raramente se dedica à lavoura. O roçado quando o faz, é unicamente para a própria manutenção. O solo, arenoso nas regiões saarizadas, ou impermeável e granítico nas chapadas, é um obstáculo invencível aos seus parcos mios de produção. A agricultura, em consequências, não é compensadora; só entra em segundo plano em sua vocação".

- "A estagnação era, assim, inevitável. Sobreveio a inércia. A pobreza - aumentada pelo flagelo - dominou as populações. E a vida do Estado, paralisada, veio assim até nossos dias".

- "As terras piauienses próprias para a agricultura, já observava Gustavo Dodt, constituem uma parte muito pequena do total do território, cuja parte maior não serve senão para a criação. não receio faltar à verdade, se considero, de cem partes de todo o território, apenas duas partes favoravelmente cultiváveis e setenta partes aproveitáveis para a criação".

- "O gado, parece-nos fora de dúvida, deveria ser o objeto primordial da administração piauiense, arrancando a indústria pastoril do sistema rotineiro em que se encontra, racionalizando-a, melhorando os rebanhos, desenvolvendo as suas indústrias derivadas".

- "Desamparado o pastoreio, como se fez, não só se prejudicou a principal indústria do Estado, como se agravou, ainda, o problema do latifúndio, que se pretendia, com isto, combater... Longe de diminuir, portanto, o latifúndio cresceu. As populações, em consequência, empobreceram ainda mais. E o pequeno proprietário, transformado, por este modo, em agregado, vinga-se a seu modo: subnutrido, produz pouco; ignorante, arrima a terra, derrubando e queimando as matas, destruindo a casa, prejudicando a pesca pelo extermínio irracional dos peixes".

- "E foi assim que a indústria da criação, depois de conhecer dias áureos, decaiu. Depois de abastecer de gado desde o Pará até Pernambuco, alcançou, em menos dias, uma situação lastimável. Oeiras, antiga capital do Estado, que chegou a possuir uma indústria de laticínios grande e próspera, é hoje uma cidade morta e decadente. E da indústria do charque, de Parnaíba, que abatia, por ano, ainda em 1824, quase dez mil cabeças de gado, hoje nada resta".

OBSERVAÇÃO. Está aí o quadro da realidade piauiense. Miséria alimentar. No interior estagnação. O MEU BOI MORREU, mas morreu o boi do Piauí. Cidades mortas, como as que pintou Monteiro Lobato. Miséria habitacional. Miséria educacional pelas cidades interioranas e zona rural. Enquanto isto, a pequena parte central de Teresina terá avenidas maravilhosas, hotéis de luxo - e na Tabuleta se edificará estádio faraônico para sessenta e cinco mil espectadores. Estamos como está a ALTA RODA - fugindo da realidade da vida por através de tranquilizantes - enquanto nós fugimos da realidade pela fantasia dos embelezamentos de avenidas e prédios, como se essas cousas representassem PROGRESSO.

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LETRA B do Abecedário Literário do Piauí, que Félix Aires está organizando: Bugyja Britto, B. Lemos, Breno Pinheiro, Baurélio Mangabeira, Berilo Nves, Balduíno Barbosa de Deus, Brito Melo.

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INDICAÇÃO de José Carlos Freitas:: "Fale sobre o PROTERRA". RESPOSTA. O PROTERRA (Programa de Distribuição de Terras e Estímulo à Agro-Indústria) é criação do Presidente Médici para solução do grave problema do desajuste econômico do Nordeste. Objetivo: "Promover o mais fácil acesso do homem à terra, criar melhores condições de emprego de mão-de-obra e fomentar a agro-indústria nas regiões compreendidas nas áreas de atração da SUDAN e da SUDENE. O PROTERRA objetiva também: "ajuda financeira à organização da propriedade rural, à organização ou ampliação de serviços de pesquisas e experimentação agrícola, a sistemas de armazenagem e silos, assim como a meios de comercialização, transporte, energia e outros".



TITO FILHO, A. Caderno de anotações. Jornal do Piauí, Teresina, p. 6, 1 fev. 1972.

sábado, 31 de janeiro de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (196)

DE JOSÉ Coelho de Resende, diretor do Departamento Financeiro da Eletrobrás, do Rio com data de 27-10-72: "Possuo a antiga LIRA SERTANEJA. Gostei imensamente da obra atual e apresento-lhe os mais efusivos parabéns pela sua colaboração. O seu trabalho está magnifico. as duas LIGEIRAS OBSERVAÇÕES sobre o vocabulário da LIRA SERTANEJA são maravilhosos e não negam pertencer a um mestre, que tão dignamente sabe honrar o nome do pai que possuiu".

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AGRADECIDO a Artur Furtado Filho, expressão do magistério piauiense, pela colaboração prestada à Academia Piauiense de Letras.

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De KÁTIA Bento, do Rio, recebo "PRINCIPALMENTE ETC", coleção de poemas enérgicos e graves, coloridos e angustiosos. Brilho verbal. Temas fundamentais. Agarra-se a poetisa a uma realidade dura. Muita força expressiva. Visão humana da vida. Leia-se este debate trágico com o destino da humanidade. Versos sacudidos de interpretações morais e espirituais da existência do homem neste angustiado século:

"a solidão é célula / compondo ventre / unhas e cabelos / do homem / a solidão flui / na corrente venosa / a solidão circulatória / a solidão é hemorragia / e não estanca / é seiva latente / se refazendo / (a solidão é verme, vírus e metástase). / É o círculo / o jogo de pega-pega / a cadeira-de-roda / a muleta, amuleto / a solidão é doença / inveterável e veterana / a solidão morde / dia e noite / com seus dentes-faca / a solidão é vampiro / Drácula ao meio-dia / caudilho e chicote".

Tenho a poesia de Kátia Bento como um conceito agônico da vida, da forma que nos legou Miguel de Unamuno.

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DE CARLOS Macedo, com data de 8-11-72: "Mestre. Dê dados biográficos do ilustre brasileiro Assis Brasil, que foi ministro no governo de Getúlio Vargas". RESPOSTA. Joaquim Francisco de Assis Brasil, gaúcho, político e historiador, nascido em 1857 e falecido em 1938. Bacharel em Direito. Deputado provincial. Deputado federal em 1933. Enviado plenipotenciário do governo brasileiro à Argentina e à China. Embaixador em Lisboa. Ministro do Brasil no México e nos EUA. Assinou em Nova Iorque a declaração pela qual o Bolivian Sindicate renunciava, mediante indenização, à concessão obtida do governo boliviano para ocupar, administrar e explorar o território do Acre. Candidato ao governo do Rio Grande do Sul contra Borges de Medeiros. Não teve reconhecida sua candidatura. Vitoriosa a Revolução e 1930, foi Ministro da Agricultura de Getúlio Vargas e depois embaixador em Buenos Aires. Obras: "História da República Rio-grandense", "Democracia Representativa", "Do Governo Presidencial", "Do voto e do modo de votar".

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CELSO Filho ofereceu-me "Carta Mensal", órgão do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio", edição de setembro de 1972. Essa revista abriga estudo de Arthur Cezar Freire Reis, que confirma a minha tese de que a riqueza do Brasil, ao tempo da Independência, estava no gado do Piauí.

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Gostei deste livro de crônicas de Amaline Issa: "Anotações sobre um testamento".

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Livro para meditação: "O Processo", de Kafka.

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ALGUMAS boas lições de português: "Linguagem e Estilo", de Laudelino Freire.

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MUITO bem organizado o "Pequeno Anedotário da Academia Brasileira de Letras", Josué Montelo.

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MAGISTRAIS cenas do quotidiano: "Éramos Seis", de Maria José Dupré.

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DE VICENTE Câmara, chefe da SUDENE no Piauí, com data de 8-11-1972: "Na oportunidade em que a SUDENE fez o lançamento do SEGUNDO PRÊMIO SUDENE DE JORNALISMO, temos a satisfação de encaminhar ao eminente professor e jornalista as normas referentes ao certame. Face à importância de que se reveste o Concurso em apreço pela Região Nordeste e, particularmente, para o Estado do Piauí, seria de grande valia contarmos com a participação da honrosa classe dos profissionais de imprensa deste Estado. Sabedores que somos do interesse sempre demonstrado pelo insigne mestre, pelas cousas dessa natureza, gostaríamos de contar com o decidido apoio de V. Sa." OBSERVAÇÃO. Já mandei a Vicente Câmara o testemunho do meu integral apoio ao patriótico concurso.

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DESAPARECEU uma inteligência vibrante que eu tanto admirava pela sua participação no movimento tropicalista, ao lado de Caetano Veloso. Chamava-se Torquato Pereira de Araújo Neto, poeta do pessimismo e da tristeza.

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LEIO em frei Mateus da Rocha que Jesus foi e será sempre problema para o homem, principalmente com a ressurreição, Jesus foi poeta. Também extraordinário pedagogo nas parábolas. E pregador, simples e familiar.

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[apagado no original]

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DE JOSÉ Antônio Ricardo Mont'alverne Lima, com data de 4-11-72: "Dr. Arimathéa. Por muitos dias estive aguardando o resultado do PROLONGADO ESTUDO do Governador do Piauí, atinente ao aumento do restante do funcionalismo, isto é, dos menos favorecidos, porque os outros já foram agraciados com os mais polpudos aumentos, por isso, era lógico que se esperasse uma providência igual para os BARNABÉS mais necessitados. Entretanto, eu creio que a surpresa e a decepção foi geral para os menos favorecidos, visto que os tais aumentos, além de virem por etapas, começaram por onde deviam terminar; além disso, as percentagens dos aumentos foram um verdadeiro disparate.

"Houve um aumento de cento e vinte por cento para a Polícia Militar; uma base de cinquenta por cento para os desembargadores; aumentos justos para professores e tabeliães aposentados; mas, para os pequenos BARNABÉS a injustiça foi a mais desumana que já se viu no Piauí".

"Caro professor, ninguém desconhece o espirito otimista e realizador do Sr. Governador; mas  verifica-se também que está insensível ao bem-estar dos pequenos BARNABÉS. Certa vez ele proclama que não adotaria injustiças no seu governo, e por que enviou essa Mensagem tão desproporcional e tão injusta? Será que esses injustiçados não têm o direito de recorrer a um órgão superior pedindo a equiparação dos seus vencimentos? Por que a Polícia Civil, que luta diariamente com os piores tipos de criminosos, não tiveram também uma reestruturação na mesma base da Polícia Militar?



TITO FILHO, A. Caderno de Anotações. Jornal do Piauí, Teresina, p. 3/p.6, 1 dez. 1972.