Quer ler este post em PDF?

sábado, 7 de março de 2015

CADERNO DE ANOTAÇÕES (197)

NO JANTAR modesto, simples, de confraternização espiritual dos membros da Academia Piauiense de Letras, pela passagem dos cinquentas e quatro anos de fundação do sodalício, pronunciei palavras de muita sinceridade. Lembrei o idealismo dos dez fundadores, dentre os quais vivos um só, Edison Cunha, crítico, orador, advogado de têmpera. Recordei a mocidade divina d Lucídio Freitas, os dias de entusiasmo e palpitação da Academia e os seus tempos de marasmo, de estagnação. Não me esqueci de Simplício Mendes, estuaste de entusiasmo, nos seus vários mandatos de presidência, e dos outros presidentes, como Clodoaldo, Higino Cunha, Martins Napoleão, Clidenor Santos, Álvaro Ferreira. Pratiquei justiça com Leônidas Melo, governador do Estado, que tanto a prestigiou, editorando obras dos acadêmicos, e com o ex-governador Helvído Nunes, solidário intransigente com as comemorações do cinquentenário. E expus o quadro de penúria em que vive, faz tempo, a Casa de Lucídio Freitas, sem um abrigo seu, vivendo em salas que as administrações lhe emprestam, ou reunindo-se nas residências particulares dos seus presidentes. Constrangedora a circunstância de a Academia possuir apenas patrimônio material de setecentos e oitenta cruzeiros. Ao menos podia pagar a edição da Revista Acadêmica. Depois destas expressões, houve o discurso do governador Alberto Silva, bem escrito tocado de humilde e rico de conceitos definidores das responsabilidades dos intelectuais. No final, a concessão de uma sede provisória à Academia Piauiense de Letras - sede que a Academia aguarda com ansiedade.

X   X   X

GERARDO Almeida exerceu, com altivez, durante meses, o mandato de vereador de Teresina (ARENA). Deixou o legislativo municipal, porque o Superior Tribunal Eleitoral reconheceu que Osmar Mendes havia padecido injustiça. Na eleição foi mais votado do que Gerardo. E este, de vereador, desceu para a primeira suplência. Na Câmara, entretanto, Gerardo revelou-se cidadão de ideias, de pensamentos, com a capacidade e o direito de DIVERGIR. Tristes dos homens que não podem, por medo ou ignorância, utilizar-se dessa prerrogativa chamada DIVERGÊNCIA. Não são homens. São castrações de inteligência  de dignidade humana. Sub-homens. Verificaram-se recentemente eleições para composição dos diretórios udenistas. Gerardo foi arredado. PUNIRAM-NO. Aliás, puniram o sublime direito que os homens têm de PENSAR, de DIVERGIR. Mas essas PUNIÇÕES exaltam, nunca enfraquecem a personalidade dos punidos.

X   X   X

DE RENATO Castelo Branco, escrevendo a respeito do Piauí e do piauiense, em obra publicada o ano passado:

- É neste labor prematuro, que lhe é imposto desde a mais tenra idade, não tem sequer a compensação de um regime alimentar recuperador. Ao contrário, agravam-se as perdas orgânicas de uma vida árdua, sob o esgotamento de um regime alimentar superdeficitário".

- "Raramente se dedica à lavoura. O roçado quando o faz, é unicamente para a própria manutenção. O solo, arenoso nas regiões saarizadas, ou impermeável e granítico nas chapadas, é um obstáculo invencível aos seus parcos mios de produção. A agricultura, em consequências, não é compensadora; só entra em segundo plano em sua vocação".

- "A estagnação era, assim, inevitável. Sobreveio a inércia. A pobreza - aumentada pelo flagelo - dominou as populações. E a vida do Estado, paralisada, veio assim até nossos dias".

- "As terras piauienses próprias para a agricultura, já observava Gustavo Dodt, constituem uma parte muito pequena do total do território, cuja parte maior não serve senão para a criação. não receio faltar à verdade, se considero, de cem partes de todo o território, apenas duas partes favoravelmente cultiváveis e setenta partes aproveitáveis para a criação".

- "O gado, parece-nos fora de dúvida, deveria ser o objeto primordial da administração piauiense, arrancando a indústria pastoril do sistema rotineiro em que se encontra, racionalizando-a, melhorando os rebanhos, desenvolvendo as suas indústrias derivadas".

- "Desamparado o pastoreio, como se fez, não só se prejudicou a principal indústria do Estado, como se agravou, ainda, o problema do latifúndio, que se pretendia, com isto, combater... Longe de diminuir, portanto, o latifúndio cresceu. As populações, em consequência, empobreceram ainda mais. E o pequeno proprietário, transformado, por este modo, em agregado, vinga-se a seu modo: subnutrido, produz pouco; ignorante, arrima a terra, derrubando e queimando as matas, destruindo a casa, prejudicando a pesca pelo extermínio irracional dos peixes".

- "E foi assim que a indústria da criação, depois de conhecer dias áureos, decaiu. Depois de abastecer de gado desde o Pará até Pernambuco, alcançou, em menos dias, uma situação lastimável. Oeiras, antiga capital do Estado, que chegou a possuir uma indústria de laticínios grande e próspera, é hoje uma cidade morta e decadente. E da indústria do charque, de Parnaíba, que abatia, por ano, ainda em 1824, quase dez mil cabeças de gado, hoje nada resta".

OBSERVAÇÃO. Está aí o quadro da realidade piauiense. Miséria alimentar. No interior estagnação. O MEU BOI MORREU, mas morreu o boi do Piauí. Cidades mortas, como as que pintou Monteiro Lobato. Miséria habitacional. Miséria educacional pelas cidades interioranas e zona rural. Enquanto isto, a pequena parte central de Teresina terá avenidas maravilhosas, hotéis de luxo - e na Tabuleta se edificará estádio faraônico para sessenta e cinco mil espectadores. Estamos como está a ALTA RODA - fugindo da realidade da vida por através de tranquilizantes - enquanto nós fugimos da realidade pela fantasia dos embelezamentos de avenidas e prédios, como se essas cousas representassem PROGRESSO.

X   X   X

LETRA B do Abecedário Literário do Piauí, que Félix Aires está organizando: Bugyja Britto, B. Lemos, Breno Pinheiro, Baurélio Mangabeira, Berilo Nves, Balduíno Barbosa de Deus, Brito Melo.

X   X   X

INDICAÇÃO de José Carlos Freitas:: "Fale sobre o PROTERRA". RESPOSTA. O PROTERRA (Programa de Distribuição de Terras e Estímulo à Agro-Indústria) é criação do Presidente Médici para solução do grave problema do desajuste econômico do Nordeste. Objetivo: "Promover o mais fácil acesso do homem à terra, criar melhores condições de emprego de mão-de-obra e fomentar a agro-indústria nas regiões compreendidas nas áreas de atração da SUDAN e da SUDENE. O PROTERRA objetiva também: "ajuda financeira à organização da propriedade rural, à organização ou ampliação de serviços de pesquisas e experimentação agrícola, a sistemas de armazenagem e silos, assim como a meios de comercialização, transporte, energia e outros".



TITO FILHO, A. Caderno de anotações. Jornal do Piauí, Teresina, p. 6, 1 fev. 1972.

Nenhum comentário:

Postar um comentário