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segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (12)

A CONCEPÇÃO - De Gondin da Fonseca: "Decorre a amnésia infantil da repressão de emoções sexuais primevas. E embora a todos nos aflija, ela se mostra, em Machado de Assis, de vigor excepcional. Incomparável artista, arguto observador, fino psicólogo, êle, contudo, não percebia as crianças. Enfaravam-no. Aborreciam-no. Jamais encontramos, em escritor algum, tamanho desinteresse e tão fundo incompreensão, tamanho desinteresse e tão funda incompreensão da alma infantil durante os primeiros anos de vida. Dir-se-á que Machado só se reconhece a si mesmo a partir da idade escolar. Pois até aí, até essa idade (seis, sete anos) não vê a criança. Não a entende". [Machado de Assis e o Hipopótamo - página 160].

POESIA - Samuel Elegância manda-me esta concepção poética, com o título de OCASO:

É tarde... a estrela já declinou,
Na amplidão do firmamento,
Já termina mais um dia,
Tudo é paz e alegria.

Um grande dia já escurece.
E a escuridão já vem com pressa,
Os pássaros cantando em côro,
Numa despedida de preces...

Tudo é calmo e sossegado,
Um vento lento vem passando,
E os passarinhos já cansados
Procuram abrigar-se nos ramos

A lua brilhante, repentina,
Já desponta com luz bonita,
Com beleza radiante,
Agrado e alegria para os corações.

DA CORRESPODÊNCIA - De Gerardo Vasconcelos, como dedicatória do livro "Lições de Medicina Legal", que o talentoso médico entregou à cultura brasileira: "Ao ilustre amigo Tito Filho, eminente professor, erudito, versátil, lutador e generoso, a gratidão pela inestimável ajuda, e a admiração, o apreço, a estima e homenagem especial do amigo ex-cordis". Grato a tanta generosidade do mestre ilustre, honra do magistério de Medicina Legal da Faculdade de Direito do Piauí.

AS NOTAS - 1) Para orientação de José Liberato Castelo Branco: Júlio Verne, francês, produziu 101 textos de ficção, e anteviu, nos livros diversos fenômenos e realizações que mais tarde se concretizaram, como o cinema, o submarino, o helicóptero, a televisão, a viagem à Lua. Despertou êle, no homem, o desejo de grandes empreendimentos. 2) Para orientação do culto e inteligente William Palha Dias, no meu modo de entender, Manuel Antônio de Almeida foi, em "Memórias de um Sargento de Milícias", repórter sincero do ambiente social da classe média no tempo do Brasil colonial. De linguagem descuidada, contudo. 3) Recebo de Lino da Fonseca extraordinário documento a respeito de várias perseguições que lhe moveram autoridades de Pôrto Velho. Injustiças e violências padeceu êle, e delas deu conhecimento aos três presidentes da República do movimento revolucionário de 1964, dos quais solicitou providencias.


A. Tito Filho, 06/03/1970, Jornal O Dia

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (11)

Livros lidos e anotados:

A FLOR E O ANTIDOTO, poemas de Fernando Whitaker da Cunha. Verbo denso, música enérgica e grave. Temas fundamentais. Profunda sinceridade. Lembra Unamuno na extraordinária força expressiva.

DESTINOS DE CONTRATEMPOS, de Fontes Ibiapina. Mais um livro do excelente contista. Interpretação da vida social nordestina, do meio, do homem - reflexo da Linguagem das crendices, dos hábitos, dos costumes, de miséria, dos tabus - gerando os dramas profundamente humanos que Ibiapina narra com fina ironia.

A REDOMA (contos), de Eliza Barreto. Livro trabalhado com arte, domínio e sutileza. Não há heróis, mas dramas particulares. Harmonia do conjunto. Substituição do descritivo pelo psicológico. Fixação de realidades íntimas, complexas e dolorosas da alma humana.

TUPI E GREGO, de Faris Antonio S. Michaele. Na obra o autor revela grandes conhecimentos dessas línguas, e os transmite com riqueza de expressão, harmonia estilística e propriedade dos termos. Lições magistrais aos estudiosos a respeito de elementos tupis e gregos bem vivos na língua portuguesa.

SOLDADOS DE TIRADENTES, de Celso Pinheiro Filho e Lina Celso Pinheiro (pai e filha). Laboriosa pesquisa de levantamento e estudo da história da Polícia Militar do Piauí, numa linguagem simples e fortemente comunicativa. Celso escreveu os vinte e nove capítulos iniciais. A morte arrebatou-o em meio ao significante esforço. A filha inteligente concluiu a obra, com a mesma dedicação.


A. Tito Filho, 29/04/1975, Jornal do Piauí

sábado, 8 de janeiro de 2011

CADERNO DE ANOTAÇÕES (10)

Com o título "Piauí em Marcha", a generosidade de Cândido Marinho Rocha concebeu estas considerações publicadas na imprensa de Belém:

A convite do presidente da Academia Piauiense de Letras, Dr. José de Arimathéa Tito Filho, a nossa Academia de Letras, com auxilio de S. Excia. o Sr. Fernando Guilhon, eminente governador do Estado, ali compareceu com uma Comissão composta por Alonso Rocha, De Campos Ribeiro e pelo cronista, afim de participar do II Encontro das Academias de Letras do Brasil.

Entre os dias 16 e 19 permaneceram sob a influencia da gentileza extraordinária daquele povo. Hospedados num hotel de extremo luxo, o Piauí Hotel, ali encontramos o conforto mais exigente, desde a piscina até o elegante bar, desde o ar condicionado em todo o prédio até os ricos tapetes coloridos, desde a decoração sofisticadíssima ao serviço eficiente do restaurante, desde a atenção com que o hóspede é atingido pessoalmente pelos eficientes servidores até à alimentação farta e saborosa. Esta foi a primeira agradável surpresa que recebemos em Teresina.

A segunda, foi o imenso parque ajardinado que há em frente ao Hotel, iluminação fria perfeita e farta, gramado primorosamente conservado, em cada canto belíssimo e artístico chafariz amenizando o ar, palmeiras regionais elegantes e bem tratadas - buriti, babaçu, tucum. E, para quebrar a monotonia, belas Acácias e Oitis faceiros. Complementando o panorama o sopro afetuoso que vem do "velho Monge", o Parnaíba, que corre um pouco mais adiante.

Não podemos continuar enumerando as demais revelações de Teresina, mas devemos citar o Palácio do Governo, pintado de branco, bem ornamentado interiormente, com gosto e sobriedade. O magnífico estádio de futebol, ainda incompleto, mas já sedutor pela jovialidade de sua construção, alegria do gramado, segurança arquitetural e localização excepcional.

O rio Parnaíba, que recebe as homenagens do sistema potamográfico do Estado, formado pelos rios Uruçuí, Vermelho, uruçuí Preto, Gurguéia, Canindé, Piauí, Poti, Longá, ornamenta a cidade, dividindo o Piauí do Maranhão. Longa avenida asfaltada segue o rio e, em fileira graciosa, erguem-se amplos bares ao ar livre, onde a sociedade se reúne para comer churrasco de bode - o fino - e tomar suco de caju - o máximo.

O Estado do Piauí é geralmente acusado, por quem o desconhece, de ser possuidor de clima insuportável, quente, e por não dispor de acomodações para turistas. Negamos a fama. Todos devemos reconhecer que atualmente a terra de Álvaro Mendes e João Luís Moura Soares cresce e aparece. A média anual do clima piauiense é de 27º, a máxima chega a 39,6º e a mínima a 16,8º. Se não fosse assim, como se poderia acreditar que em 1950 o Piauí possuía 49 municípios e 1.045.696 habitantes e em 1970 chegamos a 114 municípios e 1.734.856 almas?

O que não entendemos perfeitamente é que, antes do Piauí ser colonizado, fosse ocupado pelos temíveis índios Tupis, Caraíbas e Tapuias e hoje seja habitado por gente tão fina! Suaves são os piauienses. Harmoniosas são as damas daquelas terras. Generoso e amável o trabalhador que anda nas ruas, que tudo deixa para oferecer uma informação, uma palavra amiga, uma resposta delicada. Atencioso é o vendedor do Mercado Público que, para não ofender o comprador, diz-lhe o preço da mercadoria em sussurro. E lá tudo é mais barato do que aqui em Belém. À margem do Parnaíba, ao longo da cidade, os jumentos conduzem cargas de palhas, melancias, coco verde, mantas de carne de sol, rapaduras, cajus, milho e mandioca.

A energia da Boa Esperança não é mais apenas esperança. Chega e, dentro em breve, veremos desmentidos, com as indústrias que não existem, mas estão na agenda do operoso governador Alberto Silva, e que nos disse Tito Filho, assim: "Repare, o que mais existe no Piauí é menino e Folhas de Pagamento..."

Os meus queridos amigos piauienses aqui residentes queiram aguardar a nova crônica, em que diremos algumas palavras a propósito de Altos, Campo Maior, Piripiri, Piracuruca, Sete cidades e dos nossos inesquecíveis confrades Tito Filho, Felício Pinto, Barros Coelho, Fontes Ibiapina.


A. Tito Filho, 20/11/1973, Jornal do Piauí.