CARTA recebida, com
data de 23-11-71: "Prezado Ary. Ouço
com maior atenção e vivo interêsse o seu programa, tôdas as vezes que vai ao
ar, pela Rádio Difusora. Suas criticas constituem magnífica prova do seu valor
como jornalista e intelectual. São equilibradas e merecem crédito porque são
apresentadas com seriedade, inteligência, conhecimento e elevado espírito de
justiça. Meus parabéns por tudo que tem feito pelo Piauí. Corre, na Comissão de
enquadramento, processo de intêresse de três funcionárias do IAPEP que desejam
ser enquadradas no cargo de Fiscal de Previdência. Soube, através de pessoa
categorizada, do seu criterioso parecer no processo. Colocou as coisas nos seus
devidos lugares, reconhecendo o direito de uma das postulantes. As outras duas,
sem a menor condição. Nunca exerceram atividades relacionadas com as tarefas
especificas de Fiscal de Previdência. A primeira, cujo direito você reconheceu,
também não. Tem a seu favor a Chefia do Serviço que autoriza os trabalhos específicos
do Fiscal de Previdência. Por certo você saiu com a conclusão de que quem pode
muito pode pouco. Respeitados os aspectos jurídicos. Não desconhece você que as
atribuições específicas constantes de processos de enquadramento dos fiscais da
autarquia são as seguintes: promover fiscalização, junto aos órgãos arrecadadores
das contribuições devidas ao IAPEP, sôbre a regularidade do processamento
dessas atribuições e do seu recolhimento na forma das disposições legais e
regulamentares específicas, orientando-os nesse processamento ou notificando
quando incorrerem em infrações; faz(er) levantamento de débito proveniente de
contribuições devidas e não recolhidas; executa outras tarefas semelhantes.
Tarefas especificadas nos questionários de enquadramento dos Fiscais do IAPEP.
O processo que tramita na Comissão não foi instruído com cópia de trabalho
específico das tarefas de Fiscal de Previdência. Não, meu caro. Também não
acredito que a atual Comissão de Enquadramento, composta de bacharéis dos melhores,
onde se destaca com brilhantismo, ao lado dos demais membros não menos
brilhantes, José Torquato, filho do meu saudoso coronel Torquato, não entenda
que êsse enquadramento pretendido será a derrocada do Direito. Na certa você já
deve estar imaginando um mundo de cousas. Perguntando a si mesmo: que é que o
velho Florêncio tem com enquadramento de Fiscal de Previdência do IAPEP. Dou as
razões. Meu neto, filho do Joel, foi aprovado no concurso realizado pelo
instituto para preenchimento de duas vagas do cargo de Fiscal. O vibrante órgão de imprensa local "O
Liberal" denunciou que as duas vagas estavam destinadas a pessoas
vinculadas ao govêrno da época. O governador Clímaco, tomando conhecimento da
denúncia, fundada ou infundada, não discutiu, mandou anular o concurso. Foi
aplaudido o velho Joaqueira. Tudo esquecido, até que surge o governador Alberto
Silva criando mais uma vaga de Fiscal de Previdência. Os candidatos aprovados
no curso anterior exultam de contentamento pensando que seria realizado nôvo
concurso. Nada disso. Foi criado o lugar para acomodar as três candidatas
pleiteantes ao cargo. Daí as razões de minha carta. Por tudo isso é que
pergunto: está correta a atitude do presidente do IAPEP orientando o govêrno na
criação de mais um lugar desnecessário? Está correta a atitude da Comissão de
Enquadramento que pretende reconhecer um direito inexistente? Será que o
governador Alberto Silva aceitará essa orientação incorreta do presidente e da
Comissão? Pergunto ainda: será que "O Liberal", vigilante nos
acontecimentos do IAPEP, ainda não conseguiu desvendar o ministério para
denunciar essa situação que merece as atenções e reclama um corretivo urgente?
Por que não promovem um nôvo concurso, para dar oportunidade à juventude
estudiosa? Caso seja concretizado o enquadramento cabe uma ação popular na
Justiça? O cansaço da velhice não permite que prossiga as minhas indagações.
Deixo a você tudo isso que foi escrito, aguardando os seus esclarecimentos e
críticas. Gostei da leitura da carta, no programa de ontem, do professor
Benedito Lima. Lembrou a figura do meu velho amigo Arimathéa Tito, de saudosa
memória. Devido aos meus achaques de velho não tenho descido à cidade. Apareça
para um cafezinho. Continuo morando na mesma casa da rua Tiradentes. Um abraço
fraterno do colega e admirador”. a) Professor Florêncio da Cunha Castelo
Branco.
OBSERVAÇÃO.
Inicialmente, grato pelo incentivo que me oferece o missivista. Passo ao
assunto. O decreto 1.062 de 1970, admitiu três modalidades de enquadramento,
praticamente reduzidas a duas, definindo-as nos parágrafos 1º e 2º do artigo
6º. A primeira é o enquadramento direto, simples, caracterizado pelo ajustamento
de cargos e funções aos grupos e níveis correspondentes, com o respectivo
ocupante, consideradas a investidura e a continuidade do exercício. O
enquadramento genérico e o específico afinam por outro caminho. São novos tipos
de ajustamento. Não individualizam. Antes, especificam critérios e generalizam.
Aqui serão indicados os grupos e níveis correspondentes para ajustamento dos
ocupantes dos cargos e funções, com obediência aos critérios da experiência, da
complexidade de tarefas, da aptidão, dos deveres e das responsabilidades do
funcionário. Considero que o objetivo mais alto da lei, no parágrafo 2º, do
artigo 5º, foi o de assegurar à administração maior rendimento e premiar o
servidor que desempenhe tarefas com os critérios exigidos para o respectivo
ajustamento. Não se trata de readaptação, pois esta se aplica ao servidor
desviado de suas funções. Trata-se de ajustamento, para que se aproveite a
experiência, a competência, a aptidão do servidor. E note-se que a norma é
imperativa. Diz o decreto: serão ajustados. Caso notório do futuro do presente
em lugar do imperativo verbal, como nos mandamentos divinos: não matarás. O
caso concreto foi êste: três servidores do IAPEP invocaram o decreto citado,
juntaram documentação de sua vida funcional, e pleitearam enquadramento como
Fiscal da Previdência. Os processos vieram a mim, para parecer. Entenda-se:
para parecer nada decide. Examinei a questão nos seus aspectos jurídicos e
concluí: se essas servidoras desempenharam ou desempenham funções e nestas
revelaram experiência, aptidão, responsabilidade, e se essas funções têm
correlação com as funções de Fiscal de Previdência, então estavam as três
amparadas pelo artigo 6º (parágrafo 2º) do decreto citado. Caso não se
verifique a correlação, falecia-lhes o amparo da lei. Acrescentei que a
correlação deveria ser objeto de estudo da Comissão de Enquadramento. Essas
funcionárias juntaram ao processo documentos do exercício de várias funções. A
Comissão decida se essas funções lhes conferem os critérios exigidos para o
ajustamento pleiteado. Eis aí o meu fraco entendimento. Outros entenderão
melhor do que eu na rabulice exposta neste caderno. PASSO Às respostas pedidas
pelo missivista: 1) penso que o IAPEP precisa de mais fiscais. Atualmente, em
exercício, só existe um. Não enxergo incorreção na atitude do ilustre
presidente do IAPEP em pedir a criação de mais um cargo de fiscal. 2) A
Comissão deve examinar o caso com tôda a lisura, e os seus membros são capazes
dessa lisura. Se as funcionárias, por através da documentação apresentada,
estão aptas para o exercício da função de fiscal, têm direito ao respectivo
enquadramento. Caso contrário, evidenciar-se-á favoritismo. 3) Não creio que o
governador Alberto Silva chancele incorreções. 4) Quanto ao jornal "O
Liberal", nada posso dizer. Êsse jornal possui direção - e à direção cabem
as responsabilidades das ações e omissões. Digo mais: tal órgão de imprensa
muito me hostilizou, injustamente. Padeci com humildade as suas ofensas
gratuitas, sem que me deslembrasse da grandeza de Deus. 5) Caso as três
funcionárias não tenham direito ao que pleiteiam, o govêrno, certamente,
promoverá concurso para preenchimento dos lugares vagos de Fiscal da
Previdência. 6) Se as três funcionárias não preencheram os requisitos para o
enquadramento pleiteado, se se fizer o enquadramento ao arrepio dos critérios
legais estabelecidos, cabe ação popular, regulamentada pela Lei Federal 4717,
de 29-6-65. Ação promovida por quem seja cidadão, isto é, eleitor, ação que se
fundamente essencialmente no direito político do cidadão. Ação para invalidar
ato legítimo e lesivo ao patrimônio público, danoso aos bens ou interêsses da
coletividade. A lesividade abrange o patrimônio material, histórico, espiritual,
estético, moral.
TITO FILHO, A.
Caderno de anotações. Jornal do Piauí,
Teresina, p. 2, 15 dez. 1971.
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