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segunda-feira, 15 de setembro de 2014

CADERNO DE ANOTAÇÕES (183)

DESSA extraordinária figura humana que se chama Félix Aires, do Rio, com data de 9-12-71: "Tito Filho. Recebi e já entreguei o ofício de designação dos acadêmicos Cristino Castelo Branco, Martins Napoleão, Bugyja Britto e Moura Rêgo como representantes da Academia Piauiense de Letras junto à Federação das Academias de Letras do Brasil. Brevemente estarei em Teresina para conversar com o amigo e tomar um sorvête de bacuri. Divulgue êste regime alimentar para a velhice: arroz integral, pão integral, legumes, verduras, feijão, bôlo de bacalhau com cará, abóbora cozida, grão-de-bico. Tempêro: óleo, alho e um sal especial. Frutas: mamão, melancia, morango, maça. O regime emagrece o paciente, mas os achaques da velhice desaparecem".

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Outra recomendação de Karla: "Peço que diga a função sintática de todos os elementos das sentenças: "Admira-se a Bernardes" - "O livro é meu”. RESPOSTA. Primeira oração. Sujeito indeterminado. O pronome SE indica tal indeterminação. Predicado é o verbo. Objeto direto: a Bernardes. Trata-se de objeto direto preposicionado, de que em alguns casos a gente pode fazer uso. Um dos casos: quando o objeto direto aparece representado por nome de pessoa. Segunda oração: o predicado é o verbo. Sujeito: o livro. O artigo aí faz papel de adjunto adnominal. MEU funciona como predicativo do sujeito.

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Livros recomendados para leitura: "Deus e o Homem na Poesia e na Filosofia", de Amorim de Carvalho; e "La Fragmentacion Linguística de la Romania", de Wartburg.

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Outro mandamento de Karla: "Faça a distinção entre TE e TI". RESPOSTA. Os pronomes chamados oblíquos átonos aparecem com verbos: antes do verbo, depois do verbo, no meio do verbo. É ocaso do pronome TE. Empregam-se os oblíquos tônicos quando acompanhados e preposição. É o caso de TI. Exemplificação: ABRAÇO-TE, DEI A TI, FALEI DE TI, ENTRE TI E MIM.

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CONCURSO de dança: o casal que conseguir dançar quarenta horas, seguidamente, ganhará dois mil cruzeiros de premiação. A isto se está chamando de A FESTA DO SÉCULO. Pobre mocidade. Pobre Teresina. Há três ou quatro anos aqui estiveram médicos, psicólogos, sociólogos, economistas. Realizaram inquéritos. Com alguns conversei. Revelaram-me que Teresina é a cidade brasileira em que mais há preocupação com futilidades, com superfluidades. Espantoso. De um de janeiro a trinta e um de dezembro - festas, festinhas, festocas, festanças. Comes e bebes. Rainha disto e rainha daquilo. Misse de qualquer cousa. Fartança de tertúlia. Clubes das mais variadas denominações. Afrontosas a ociosidade e a dissipação das classes altas. Afrontosa a uma cidade pobre, de aflitivos problemas sociais. Cidade paupérrima, bairros sujos, de sentinas de buracos, cidade escura, lixenta, desarborizada, desnutrida. Mendicância nas ruas, meretrício que é a fisionomia doente da cidade. E a juventude? Que se está fazendo pela juventude? Então é possível educar com o ócio e com o supérfluo? Vive-se aqui de bródios, de ceias esticadas, de reuniões para o vazio. E venha concurso de dança. Rebolado de quarenta horas. Parece que ninguém preza a saúde dos moços. Quanto mais a mocidade receber a mensagem de que a vida é prazer, luxo, brutalidade, materialização da vida - melhor. As livrarias vivem às môscas. Agoniza a vida intelectual. Constituem CAFONICE os assuntos culturais. No Dia da Cultura, o govêrno preocupa-se com o episódio Pelé. Desde o despontar do dia até o instante em que as tertúlias encerravam atividades - Pelé foi vedete. E Rui Barbosa fazem paz no túmulo.

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O NOBRE professor Pedro Vasconcelos Filho encaminhou-me diploma de Honra ao Mérito do MOBRAL NACIONAL, concedido "pela participação no processo de erradicação do analfabetismo, contribuindo assim para o desenvolvimento de sua comunidade e para a promoção do Homem Brasileiro". Diploma assinado pela figura exponencial do padre Felipe Spotorno, Secretário Executivo do Movimento Brasileiro de Alfabetização. Conheci-o em Brasília ano passado. Guardo do padre Felipe impressão magnífica. Impressão da sua fé, da sua coragem cívica, do seu amor à causa que lhe confiaram. Não sei se mereci a diplomação. Tenho, porém, consciência tranquila de haver contribuído para o trabalho do MOBRAL no Piauí, solidário sempre com êsse combatente do bom combate, Pedro Vasconcelos Filho.

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Em mensagem à Assembléia Legislativa, escreveu o governador Alberto Silva: "Lembrando que, praticamente, todos os Estados do Norte e Nordeste e todos os Estados da União já possuem, ou estão em fase adiantada de programação e construção dos seus Estádios Estaduais, não poderia o govêrno, preocupado em reformular conceitos e integrar efetivamente o Piauí na nova mentalidade implantada no Brasil pelo Governo da Revolução, deixar de tomar a corajosa iniciativa que se propõe". OBSERVAÇÃO: A CORAJOSA INICIATIVA nada mais é do que a construção do ALBERTÃO, estádio para sessenta mil pessoas, numa cidade que tem pouco mais de duzentos mil habitantes. Duvido que seja MENTALIDADE revolucionária o desperdício de dinheiro com elefantes brancos, com estádios faraônicos. Só o terreno, quinhentos mil contos, pertencente a deputado federal da ARENA. Projeto da monstruosidade: seiscentos e quarenta mil contos, pagos a uma firma mineira, entusiasmada de tanto dinheiro. Engana-se o ilustre governador ao afirmar que todos os Estados possuem ou estão programando estádios de futebol, principalmente estádio tipo pêso-morto, infalivelmente deficitário. Não possuem estádios estaduais nem os programando ou construindo: Acre, Pará, Maranhão, Paraíba, Espírito Santo, Estado do Rio, Paraná, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso, Rio Grande do Sul. O grande estádio Beira rio de Pôrto Alegre, é particular, e o único que se vem autosustentando por tudo que ali se vende é fabricado pelo clube Internacional.  Comentário do dito Armando Nogueira, comentarista do Jornal do Brasil, demonstrou, numa série de artigos, que êsses espalhafatosos estádios oferecem prejuízos incalculáveis. Como o de Manaus (Tartarugão), o da Guanabara (Maracanã), o e Belo Horizonte (Mineirão), o de Aracaju (Batistão). A única vantagem que êles proporcionam - sustenta Armando - se relaciona com os governadores, que dão o nome aos tais bois. O ex-governador Castelo, do Ceará, iniciou o Castelão - e a triste herança passou a Cals. O sr. Aluisio Alves trombeteou o de Natal, batizado Aluisão, recebido pelo finado governador Gurgel (sacerdote católico). E lá se encontra inacabado o pomposo elefante. O de Maceió, o Pelezão, dá tanto prejuízo ao govêrno que o governador das Alagoas deseja livrar-se dêle por qualquer preço, segundo me confessou Rodrigues Filho. Observe-se que o Estado da Guanabara tem população metropolitana de mais de sete milhões de habitantes, grande parte louca por futebol, com torcidas organizadas, e o Maracanã vive quase sempre sêco. Lotação do Maracanã: cento e cinquenta mil pessoas para a população referida, enquanto aqui, nesta Teresina grávida de problemas - de pauperismo aviltante -, população de duzentos mil, se pretende um estádio para sessenta mil pessoas, em bairro distante. quem vai lotar essa praça faraônica? O futuro dirá de que lado se encontra a razão. E haverá necessidade de que se apurem responsabilidades.

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Prometi, no jornal de domingo, algumas considerações a respeito da literatura piauiense. Faltou-me tempo. Fica o assunto para quinta-feira.




In: TITO FILHO, A. Caderno de anotações. Jornal do Piauí, Teresina, p. 2, 21 dez. 1971.   

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